A operação da Polícia Federal que mirou o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL), animou aliados do ex-presidente, que acreditam no enfraquecimento da delação premiada com a investigação da suposta fuga do militar para Portugal. Na avaliação dos bolsonaristas, a investigação da Procuradoria-Geral da República (PGR) reforça inconsistências nos depoimentos em que acusa Bolsonaro de ser o articulador do plano de golpe de Estado.
Cid foi alvo de uma operação da Polícia Federal na sexta-feira, 13, no inquérito que investiga um suposto plano de fuga para Portugal. A PGR pediu a abertura do inquérito após familiares do militar deixarem o país nas últimas semanas.
De acordo com as investigações, o ex-ministro do Turismo no governo Bolsonaro, Gilson Machado, teria pedido ao Consulado de Portugal em Recife (PE) para emitir um aporte do país para o tenente-coronel. Tanto Machado quanto Cid negam as acusações.
O ex-ministro foi preso na manhã de sexta-feira em sua casa na capital pernambucana, mas foi solto horas depois. Cid foi alvo de busca e apreensão e precisou prestar depoimento de quase três horas na sede da PF em Brasília.
Parte da cúpula bolsonarista avaliou que a abertura de investigação veio no “momento certo”, em que Bolsonaro tenta se esquivar da avaliação negativa de seu depoimento ao Supremo Tribunal Federal (STF) no inquérito que investiga a tentativa de golpe de Estado. Para os aliados, há chances de a investigação reduzir os efeitos da delação e, de quebra, enfraquecer as denúncias contra o ex-presidente, acusado por ao menos cinco crimes, incluindo o atentado ao Estado Democrático de Direito.
Bolsonaro prestou depoimento ao STF na última terça-feira, 10, e negou ter participado do plano para um golpe de Estado. Entretanto, o ex-presidente chegou a itir ter cogitado a decretação de estado de sítio e a Garantia da Lei e da Ordem (GLO). Ele também assumiu ter se reunido com os chefes das Forças Armadas e que chegou a ler a minuta golpista encontrada na casa de Anderson Torres, mas afirmou não ter alterado o documento.
Já outros aliados disseram à ISTOÉ que a operação contra Cid não deve alterar o curso do processo para Bolsonaro. Na avaliação deles, o ex-presidente deve ser condenado e que o foco é segurar a prisão ou até conseguir um regime domiciliar. Alguns, inclusive, defendem usar a condenação como uma alavanca para a campanha eleitoral de 2026.
Jurista vê base para manter delação de Cid
A advogada Maira Recchia vai na contramão do otimismo dos bolsonaristas e não vê impacto da operação na credibilidade da delação de Mauro Cid. Na avaliação da jurista, as provas colocadas pela PGR e a issão dos réus em trechos dos interrogatórios são sustentáveis para manter o andamento do processo.
“Além da delação ser apenas um dos meios de prova, o processo está seguindo seu curso e está muito bem instruído. A delação está sólida e cumpriu seu papel. A prova disso é a denúncia da PGR com tantas autoridades respondendo a processos e o interrogatório de todos praticamente confessando e confirmando os termos da ação penal” disse.
A investigação da possível fuga do tenente-coronel não é a primeira que atinge o núcleo bolsonarista. A Polícia Federal ainda mantém o inquérito para investigar a ida do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do ex-presidente, para os Estados Unidos. Ele se licenciou do cargo no Brasil e tem tentado articular no Congresso americano a aplicação de sanções contra o ministro Alexandre de Moraes, do STF.
Para Maira, as suspeitas sobre Cid deve aumentar a atenção da PF e da Suprema Corte sobre a possibilidade de fuga de outros réus envolvidos no inquérito que investiga a tentativa de golpe de Estado.
“Há a demonstração inequívoca de tentativa de se furtarem à aplicação da lei penal. Eduardo Bolsonaro já está fora do Brasil e continua atentando contra nossas instituições. Zambelli fugiu e agora a família do Cid já está fora e há indícios de que ele também estava em vias de fuga com aporte estrangeiro. Isso demonstra o conluio e unidade de desígnios de todos”, ressaltou a advogada.
“Entendo que além de representar ação negativa contra o ex-presidente, pode ser motivo suficiente para atenção das autoridades, pois resta claro que esse grupo organizado, tem o mesmo modus operandi”.
Depoimento de Mauro Cid
Mauro Cid prestou depoimento por quase três horas na sede da Polícia Federal em Brasília (DF). Ao lado da advogada Vânia Bittencourt e do advogado Cézar Bittencourt, Cid negou ter planejado a fuga para Portugal.
Ele itiu ter carteira de identidade e cidadania portuguesa, assim como sua família, e, de acordo com os advogados, ele se dispôs a entregar os documentos. Em depoimento, Cid confirmou a saída da família do país no dia 30 de maio para comemorar o aniversário de uma sobrinha em Orlando, nos Estados Unidos. O ex-ajudante de ordens ressaltou que a esposa e as duas filhas devem retornar ao Brasil na próxima semana.
A suspeita da Polícia Federal e da PGR foi pela falta de informação sobre a viagem de uma das filhas de Mauro Cid. Com isso, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, pediu a Moraes a abertura do inquérito para investigar o caso.
Gonet chegou a pedir a prisão preventiva de Cid, que foi acatada por Moraes na primeira decisão. O ministro, porém, recuou minutos depois e manteve apenas a busca e apreensão contra o militar.